Alimentação e autoritarismo no Brasil nos 70 anos de história
descompassos para o direito social à alimentação
DOI:
https://doi.org/10.14295/jmphc.v15.1317Palavras-chave:
Autoritarismo , Fome , Agroindústria , Brasil , Direito Humano à Alimentação AdequadaResumo
A história do autoritarismo no Brasil é complexa, disfarçada por uma educação que coloca uma certa “harmonia social” na trajetória política brasileira, enquanto ela é marcada por um enraizamento que naturaliza estruturas autoritárias, por trás do racismo, mandonismo, coronelismo, corrupção, desigualdade social, violência, desigualdade de raça e gênero e intolerância, que permanecem na organização político-econômica até hoje. Os governos autoritários da história do Brasil recente são: o Estado-novo de Getúlio Vargas (1937–1945), a Ditadura Militar (1964–1985), governado por Pascoal Ranieri Mazzilli, Humberto de Alencar Castelo Branco, Artur da Costa e Silva, Junta Militar, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Batista de Oliveira Figueiredo e o Governo instalado após o Golpe de 2016, liderado primeiramente por Michael Temer e em seguida, por Jair Messias Bolsonaro. Ao buscarmos a compreensão histórica da alimentação observa-se que as primeiras políticas públicas nesta área foram criadas com o propósito de atenuar a pressão social gerada pela exploração do trabalho. Já no período da ditadura militar o país vive o chamado “milagre brasileiro”, que se esgota ao final de 1974, configurando-se numa reconcentração da renda, na qual grande parte da população trabalhadora foi excluída do processo e que resultou em aumento da fome e miséria no país. Com o objetivo de atenuar tais consequências surgiram alguns programas sociais de caráter assistencialista, ainda com interesse de mercado e voltados à indústria internacional. Ampliando a discussão para o período mais recente, a austeridade fiscal que já era prática frequente, foi intensificada depois do Golpe de 2016, como o Governo Temer, configurando-se em práticas ultraliberais, devido às contrarreformas, ajustes fiscais e gastos de cortes públicos estendendo-se ao governo de Bolsonaro, que intensificou sua postura governamental em meio a pandemia de COVID-19 em 2020. Neste contexto, o objetivo deste estudo é analisar os efeitos das medidas econômicas adotadas nos três regimes autoritários na história do Brasil republicano no que compõe a alimentação da população brasileira diante de governos progressistas que já passaram pela história do país. Foi utilizado como método a revisão integrativa de literatura, norteado pela pergunta de pesquisa: “O que a literatura científica apresenta sobre o binômio alimentação e autoritarismo no Brasil”? Após mapeamento dos descritores, a estratégia de busca que trouxe melhores resultados foi a seguinte sintaxe: (Economia) AND (autoritarismo ou fascismo) AND (alimentação OR fome OR agroindústria) AND (Brasil) e suas respectivas traduções para o inglês, (Economic*) AND (Authoritarianism OR Fascism) AND (food OR alimentation OR hungry OR Agribusiness) AND (Brazil). A busca bibliográfica foi realizada nas bases, Pubmed, Scopus, Biblioteca Virtual em Saúde – BVS, Web of Science. Foram obtidos 1.238 estudos Biblioteca Virtual em Saúde (BVS)10 estudos encontrados no (Pubmed); 363 (Scopus) e 73 (Web of Science), totalizando 1.684 publicações encontradas. Para organização dessas publicações foi utilizado o software Zotero e para limpeza e filtragem a partir de critérios de inclusão e exclusão, o software Rayyan. Foram excluídos estudos que abordavam exclusivamente de aspectos nutricionais ou exclusivamente político-econômicos, sem correlacionar os temas investigados. Foram incluídos aqueles que tratavam de políticas econômicas e programas de alimentação e nutrição, englobando alimentação escolar e programas de amamentação criados em um dos três períodos autoritários brasileiros. Além disso, não permaneceram na revisão os estudos sem permissão de acesso, livros, capítulos de livros e monografias. Através desses critérios foram incluídos nesta revisão 10 estudos. Os resultados preliminares indicam que os programas de alimentação durante o Estado Novo vinham a assegurar a reprodução da força de trabalho e apaziguar as tensões sociais, dentro de uma lógica populista. Foi criado o salário-mínimo, o qual incluía a lei da ração mínima como uma das peças de sua regulação e o Serviço de Alimentação da Previdência Social – SAPS, voltado aos segurados da previdência. Já na intervenção militar, o SAPS é extinto, possivelmente por apresentar uma ameaça ao governo, devido à possibilidade da união da classe trabalhadora dentro dos serviços. A Campanha Nacional de Alimentação Escolar – CNAE tinha fortes laços com as indústrias reconhecidas pelo Governo Federal, levando em consideração os produtos formulados e desidratados para treinamentos militares, desta forma o programa de merenda escolar garantia o mercado para essas indústrias. Em substituição à CNAE, o Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição – INAN, e em 1973 o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição – PRONAN, objetivando a melhoria dos níveis de saúde, renda e produtividade da população, sua atuação foi voltada às indústrias alimentares, suplementação emergencial, considerando a falta de acesso à alimentação básica para grande parte da população, além da suplementação materno-infantil e ações voltadas às leis trabalhistas e alimentação escolar, tais ações objetivavam o tratamento e prevenção da desnutrição, mas não alcançaram melhor distribuição de renda ou acesso à alimentação saudável. Aproximando os diferentes momentos históricos e destacando o momento a mais recente marcado pelo governo de ideal neofascista a partir do golpe de 2016, verifica-se que este veio acompanhado pelo desmonte de estratégias de alimentação importantes construídos desde o processo de redemocratização do país e também produziu o agravamento da insegurança alimentar e nutricional da população, com o aumento considerável da fome com as consequências extremas da pandemia de COVID-19 no Brasil. Mediante a esses fatos históricos pode-se associar a postura dos três governos de privilegiar ao modo de produção capitalista, reforçando a desigualdade social e propiciando a insegurança alimentar e nutricional de populações cada vez mais vulneráveis.
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