Economia política da saúde no Brasil: quem são seus pesquisadores e o que pesquisam?
DOI:
https://doi.org/10.14295/jmphc.v11iSup.759Resumo
Com o decorrer do processo histórico de desenvolvimento das forças produtivas sob a égide do modo de produção capitalista, a questão da saúde cresce gradativamente em importância e assume papel destacado tanto na reprodução da força de trabalho, como no processo de acumulação. Porém, a saúde somente se fortaleceu como objeto direto de estudo das ciências econômicas com os avanços dos conflitos imanentes ao capitalismo. Desse modo, não é de espantar que a escola de pensamento neoclássica considere a saúde como tema de teorização e pesquisa de caráter nobre, já que essa sistematização é funcional a lógica de valorização do capital. Entretanto, este desenvolvimento das forças produtivas e, por consequência, aprofundamento das contradições - imanentes ao modo de produção capitalista - não favorece somente a elaboração dos paradigmas e sistematização do pensamento neoclássico, seus críticos também ‘bebem’ dessa mesma fonte. Mais especificamente, a análise marxiana contida na crítica a economia política clássica e seus comentadores inauguram o entendimento que os níveis de saúde de uma população são determinados pelos seus condicionantes materiais e não somente pelo acesso a assistência à saúde. Esta crítica se contrapõe diretamente aos axiomas neoclássicos que insistem em permanecer no estreito entendimento da microeconomia – endereçando a problemática da saúde a resoluções de ordem meramente técnico-gerencial – se negando a enxergam a saúde na totalidade de suas relações sociais.A partir desta problemática, este artigo tem como objetivo mapear os pesquisadores que trabalham na área de economia política da saúde no Brasil para discutir sobre o papel da ‘economia política’ na área da ‘economia da saúde’ e sua contribuição para tencionar o pensamento econômico. Portanto, empregou-se uma análise de cunho quantitativo, de modalidade descritiva.Fez-se necessário identificar quais são os pesquisadores que se dedicam à área da ‘economia da saúde’. Para isso, foi realizada uma busca na plataforma Lattes com descritor ‘economia da saúde’ e circunscrevendo apenas os doutores. Com o uso deste critério, dos 471 dos currículos identificados em uma primeira etapa de busca, apenas 254 (53,93%) podem ser considerados ‘economistas da saúde’, o que se considerou como o total de pesquisadores (100%) que se dedicam cotidianamente ao desenvolvimento da ‘economia da saúde’ no Brasil. Uma vez que os pesquisadores, do campo em questão, foram delimitados realizou-se uma busca em seus currículos com o descritor ‘economia política’. Desta vez, sem nenhuma modalidade de filtro, considerando apenas a presença categórica do descritor, o que evidenciou que 29,92% (76) dos pesquisadores apresentavam a presença do descritor ‘economia política’.Com o intuito de aprofundar a descrição dos ‘economistas da saúde’ foi estudado a maneira com que se distribuíam em suas graduações – primeira e segunda – e área de doutorado. Na primeira graduação é evidente o predomínio de dois cursos: Ciências Econômicas 34,25% (87) e Medicina 26,38% (67), a maioria dos pesquisadores não apresentavam segunda graduação 94,88% (241) e na área de doutorado mostrou-se a preponderância de três áreas – Saúde Coletiva/Saúde Pública/Medicina Preventiva 29,13% (74), Economia 27,95% (71) e Ciências Médicas 9,84% (25).Após essa primeira aproximação – que delimitou os pesquisadores, a familiaridade com as análises da economia política, graduações e área de doutorado – realizou-se um mapeamento da produção de artigos publicados em periódicos científicos nas seguintes subáreas: ‘Financiamento’, ‘Política de Saúde’, ‘Gestão em Saúde’ e ‘Análise/Avaliação de Custo, Efetividade e Eficiência’. Foi identificado que 20,47% (52) dos pesquisadores produzem na subárea do ‘Financiamento’, 13,39% (34) na subárea de ‘Política de Saúde’, 20,87% (53) na subárea de ‘Gestão em Saúde’ e 42,52% (108) na subárea de ‘Análise/Avaliação de Custo, Efetividade e Eficiência’. Além disso, estratificando-se a produção de ‘Análise/Avaliação de Custo, Efetividade e Eficiência’ pela área de doutorado é possível notar uma predisposição por autores provenientes de áreas da saúde, principalmente, Saúde Coletiva/Saúde Pública/Medicina Preventiva 31,48% (34) e Ciências Médicas 18,52% (20), desse modo, ocupando maior relevância que pesquisadores provenientes da área de Economia.Esta predileção do pensamento neoclássico pela gestão e análise de custo deve-se pela restrição de somente trabalharem com categorias ‘operacionalizáveis’. Desse modo, direcionam suas análises somente para a indústria do cuidado à saúde, derivando desta a responsabilidade pelos níveis de saúde da população. Absolutamente tudo se reduz a expressão ‘contábil’, sendo a saúde correspondente à capacidade produtiva da sociedade em questão. A partir da impossibilidade da análise neoclássica em aproximar-se do objeto em questão – a saúde – por suas opções teórico-metodológicas – dissocia a saúde da totalidade das relações sociais. Esta autoimposição de análises estritamente microeconômicas das quais a economia da saúde é herdeira corrobora para o reducionismo linear entre utilização dos serviços de saúde e níveis de saúde desta população. Porém esta retórica cumpre uma agenda muito clara, como alerta Braga e Paula: “O problema da saúde vai reduzir-se ao problema da atenção à saúde”. Isto pode ser constatado pela clara filiação da produção da economia da saúde às subáreas de ‘Gestão em saúde’ e ‘Análise/Avaliação de Custo, Efetividade e Eficiência’.Além disso, no intuito de descrever os níveis de aproximação dos ‘economistas da saúde’ com a ‘Economia Política’, além da primeira análise categórica, empregou-se uma análise de suas produções de artigos publicados em periódicos científicos com filiação a ‘Economia Política’ e ‘Economia Política da Saúde’. Este aprofundamento da análise ressaltou que apenas 11,02% (28) dos pesquisadores filiam suas produções a ‘Economia Política’ e, residualmente, 2,36% (6) analisam à ‘saúde’ por este prisma. Além disso, esses pesquisadores que filiam suas análises aos paradigmas abarcados pela economia política são, majoritariamente, advindos de doutorados na área da Economia 76,92%(20) e com a área de Saúde Coletiva/Saúde Pública/Medicina Preventiva 11,54%(3) assumindo um papel minoritário. O presente artigo procedeu uma primeira abordagem do campo da ‘economia política da saúde’. É possível dizer que os pesquisadores que se dedicam à ‘economia política da saúde’ no Brasil é praticamente inexpressiva quando considerada a economia da saúde com um todo. A ‘economia da saúde’ no Brasil é herdeira do pensamento neoclássico e sua produção científica em ‘Economia Política’, ainda mais especificamente no setor saúde, é vestigial.
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