Renúncia fiscal e subfinanciamento do SUS

uma revisão da literatura

Autores

DOI:

https://doi.org/10.14295/jmphc.v15.1343

Palavras-chave:

Financiamento da Assistência à Saúde, Sistema Único de Saúde, Capitalismo

Resumo

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a saúde como um dever do Estado e um direito do cidadão. Por meio do Sistema Único de Saúde – SUS, todos os cidadãos deveriam ter acesso aos serviços de saúde de acordo com suas necessidades, independentemente de sua capacidade de pagamento, inserção no mercado de trabalho ou condição de saúde. No entanto, desde sua criação, o SUS tem enfrentado um subfinanciamento crônico. A luta por recursos financeiros para garantir políticas públicas universais de saúde tem sido uma constante. Além disso, a arrecadação de impostos tem sido bastante prejudicada pela renúncia fiscal em várias áreas, com redução da arrecadação, e do montante a ser investido. A renúncia fiscal ocorre na própria área da saúde, em três modalidades principais: deduções de despesas em saúde do imposto de renda (IR) em pessoas física e jurídica, a isenção de impostos da indústria farmacêutica e de equipamentos médicos, a isenção de impostos das entidades ditas “filantrópicas”. As deduções no IR pessoa física beneficiam apenas as classes mais privilegiadas, capazes de arcar com planos de saúde ou atendimento particular, em serviços que priorizam a atenção especializada, muitas vezes com excesso de exames complementares. Em detrimento ao atendimento primário SUS, mais abrangente e barato, e acessível às classes menos privilegiadas. Mesmo com acesso aos planos de saúde, esta população continua utilizando o SUS nos procedimentos mais onerosos como hemodiálise ou tratamento oncológico. A isenção da indústria farmacêutica e de equipamentos médicos visaria à redução de preço dos medicamentos e equipamentos. Processo pouco transparente em relação aos impostos não arrecadados e valores reais de redução dos mesmos. A isenção das entidades “filantrópicas” acaba beneficiando serviços de atendimento da população mais abastada. Ainda que as entidades em si sejam “sem fins lucrativos”, muitas são locais de funcionamento de serviços privados e lucrativos. Portanto, as renúncias fiscais, na própria área da saúde reduzem a arrecadação global com ações que acabam privilegiando as classes mais favorecidas, ao mesmo tempo que indiretamente reduzem a capacidade de investimento no SUS. Este estudo tem como objetivo realizar uma revisão da literatura nacional e internacional sobre a renúncia fiscal e suas consequências para o subfinanciamento do SUS. O método escolhido para esta pesquisa foi o de revisão sistematizada da literatura cientifica, a partir da pergunta de pesquisa “O que a literatura vem disponibilizando sobre a relação entre renúncia fiscal e financiamento da saúde no contexto do capitalismo contemporâneo?”. A partir da pergunta da pesquisa identificamos os polos correspondentes: a) o polo fenômeno “renúncia fiscal”; o polo população “financiamento da saúde” e o polo contexto “capitalismo contemporâneo”. Para a elaboração da sintaxe da revisão, optou-se por trabalhar com os polos fenômeno e população, por entender que o polo contexto seria verificado quando da leitura dos títulos das publicações levantadas, mantendo apenas os que se referiam ao período posterior dos anos 1990, caracterizando o capitalismo contemporâneo. A busca exploratória foi realizada no Portal de base de dados do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde – Bireme / Biblioteca Virtual em Saúde – BVS, utilizando os operadores booleanos “OR” (entre os descritores de cada Polo) e posteriormente “AND” (entre os Polos: Fenômeno-População) para se obter a sintaxe final. Inicialmente, para a construção da expressão de Busca utilizou-se a identificação na BVS “descritor de assunto”. Após inúmeras tentativas obtivemos retorno de um número muito pequeno de publicações. Desse modo, optou-se por modificar a identificação, passando para “termo livre”, disposto na BVS como “título, resumo e assunto”. Ao utilizarmos o operador boleano “AND” entre os dois polos, foram encontradas 210 publicações, por meio da sintaxe final (("renuncia fiscal") OR ("isencao fiscal") OR ("imposto de renda") OR ("gasto tributario em saude")) AND (("Financiamento da assistencia a saude") OR ("Financiamento dos Sistemas de Saude") OR ("Recursos em saude") OR ("Alocacao de recursos") OR ("Financiamento Governamental") OR ("Gastos em saude") OR ("Alocacao de Recursos para a Atencao à Saúde")), realizada em 23 de março de 2023. Da leitura sistematizada dos títulos e resumos das 210 publicações, foram excluídos sete estudos repetidos, obtendo um total de 203 publicações. Para análise de elegibilidade das publicações foram considerados os seguintes critérios de inclusão: renúncia fiscal, arrecadação de impostos, financiamento de sistema de saúde. Foram incluídos para a seleção de análise somente artigos científicos e monografias do IPEA, publicados em português, espanhol e inglês. As monografias / textos para discussão (TD) do IPEA foram consideradas elegíveis por serem publicações revisadas por pares, portanto incluídas como material cientifico. A partir dos critérios definidos foram excluídas seis produções acadêmicas, sendo um livro, um portfólio, quatro teses, restando 197 publicações. Na sequência foi efetuada a leitura sistematizada dos títulos e resumos dos resultados encontrados, sendo excluídos 160 e 16 estudos, respectivamente, conforme os critérios acima mencionados. Restaram 21 artigos dos quais quatro não estavam disponíveis na íntegra para leitura, correspondendo a 17 estudos considerados incluídos.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

Brasil. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências [Internet]. Brasília, DF: PR; 1990 [citado 27 mar. 2023]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm

Reis, Carlos. Sustentabilidade do SUS e renúncia de arrecadação fiscal em saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 23(6):2035-2042, 2018. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.05992018

Ocké-Reis CO. Os problemas de gestão do SUS decorrem também da crise crônica de financiamento?. Trab educ saúde [Internet]. 2008;6(Trab. educ. saúde, 2008 6(3)):613–22. Available from: https://doi.org/10.1590/S1981-77462008000300012. DOI: https://doi.org/10.1590/S1981-77462008000300012

Andreazzi M de FS de, Ocké-Reis CO. Renúncia de arrecadação fiscal: subsídios para discussão e formulação de uma política pública. Physis [Internet]. 2007;17(Physis, 2007 17(3)):521–44. Available from: https://doi.org/10.1590/S0103-73312007000300007. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-73312007000300007

Ocké-Reis CO, Andreazzi M de FS de, Silveira FG. O mercado de planos de saúde no Brasil: uma criação do estado?. Rev econ contemp [Internet]. 2006Jan;10(Rev. econ. contemp., 2006 10(1)):157–85. Available from: https://doi.org/10.1590/S1415-98482006000100007. DOI: https://doi.org/10.1590/S1415-98482006000100007

Ocké-Reis CO. O público e o privado na saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2006Dec;22(Cad. Saúde Pública, 2006 22(12)):2722–4. Available from: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2006001200022. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2006001200022

Costa S da S. Pandemia e desemprego no Brasil. Rev Adm Pública [Internet]. 2020Jul;54(Rev. Adm. Pública, 2020 54(4)):969–78. Available from: https://doi.org/10.1590/0034-761220200170. DOI: https://doi.org/10.1590/0034-761220200170

Mendes, Á. Crise do Capital e o Estado: o desmonte da Saúde Pública brasileira em curso no neofascismo de Bolsonaro. In: MENDES, Á; CARNUT, L (orgs.). Economia política da saúde: uma crítica marxista contemporânea. São Paulo: Hucitec, 2022. p. 96-153.

Mendes Á, Carnut L, Guerra LD da S. Reflexões acerca do financiamento federal da Atenção Básica no Sistema Único de Saúde. Saúde debate [Internet]. 2018Sep;42(Saúde debate, 2018 42(spe1)):224–43. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-11042018S115. DOI: https://doi.org/10.1590/0103-11042018s115

Mendes Á, Weiller JAB. Renúncia fiscal (gasto tributário) em saúde: repercussões sobre o financiamento do SUS. Saúde debate [Internet]. 2015Apr;39(Saúde debate, 2015 39(105)):491–505. Available from: https://doi.org/10.1590/0103-110420151050002016. DOI: https://doi.org/10.1590/0103-110420151050002016

Mendes, E. V. As políticas de saúde no Brasil nos anos 80: a conformação da reforma sanitária e a construção da hegemonia do projeto neoliberal. In: _____, E. V. (org). Distrito Sanitário: o processo social de mudança das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. 3 ed. Rio de Janeiro: HUCITEC-ABRASCO, 1995, p. 19-91.

Vianna SM. A Seguridade Social e o SUS: re-visitando o tema. Saude soc [Internet]. 2005Jan;14(Saude soc., 2005 14(1)):7–22. Available from: https://doi.org/10.1590/S0104-12902005000100003 DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902005000100003

Piola, S. F. e S. M. VIANNA, orgs. (1995) Economia da saúde: conceitos e contribuição para a gestão da saúde Brasília: IPEA.

Ocké-Reis CO. Qual é a magnitude do gasto tributário em saúde? Boletim de Análise Político-Institucional (IPEA) 2014; 5:71-76.

Alvarenga LVH. Gastos Tributários Sociais – Como estamos? In: Encontro Nacional de Economia Política. Porto Alegre: UFRGS, 2012.

Surrey, S. Pathways to tax reform. Cambridge, Mass., Harvard University Press, 1973.p.vii. DOI: https://doi.org/10.4159/harvard.9780674436503

Salvi, A. F. C.; Paula, E. V. M.; Loures, M. M. G. Gastos governamentais indiretos de natureza tributária - conceituação. Brasília: Receita Federal, 2003. (Estudos Tributários, n. 12).

Ocké-Reis CO, Cardoso S de S. A regulamentação dos preços dos planos individuais de saúde. Brazil J Polit Econ [Internet]. 2011Sep;31(Brazil. J. Polit. Econ., 2011 31(3)):455–70. Available from: https://doi.org/10.1590/S0101-31572011000300008. DOI: https://doi.org/10.1590/S0101-31572011000300008

Andrade EIG, Dias Filho, PPS. Padrões de financiamento da saúde do trabalhador: do seguro social ao seguro saúde. In: Lobato LV, Fleury, organizadores. Seguridade Social, Cidadania e Saúde , Rio de Janeiro: Cebes, 2009. p. 160-172.

Werneck Vianna MLT. A Americanização (Perversa) da Seguridade Social no Brasil: estratégias de bem-estar e políticas públicas . Rio de Janeiro: Revan; 1998.

Piola SF, Paiva AB, Sá EB, Servo LMS. Financiamento público da saúde: uma história à procura de rumo. Rio de Janeiro: Ipea; 2013. (Texto para Discussão, n. 1.846.)

Mossialos E, Thomson S. Voluntary health insurance in the European Union: a critical assessment. International journal of health services 2002; 32(1):19-88. DOI: https://doi.org/10.2190/K6BP-3H1R-L41M-HVGE

Machado, Felipe Galvão. Renúncia de arrecadação fiscal em saúde no estado brasileiro: forma política-jurídica no capitalismo contemporâneo [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública; 2017 [citado 2023-04-23]. doi:10.11606/D.6.2017.tde-23102017-181735. DOI: https://doi.org/10.11606/D.6.2017.tde-23102017-181735

Downloads

Publicado

23-10-2023

Como Citar

1.
Oliveira VR, Mendes AN. Renúncia fiscal e subfinanciamento do SUS: uma revisão da literatura. J Manag Prim Health Care [Internet]. 23º de outubro de 2023 [citado 22º de dezembro de 2024];15(spec):e038. Disponível em: https://jmphc.emnuvens.com.br/jmphc/article/view/1343

Artigos mais lidos pelo mesmo(s) autor(es)

Artigos Semelhantes

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 > >> 

Você também pode iniciar uma pesquisa avançada por similaridade para este artigo.