Crítica à tendência de exploração capitalista do sangue humano
corpo-mercadoria a partir do pensamento de Gerardo Ávalos e de Haber e Renault
DOI:
https://doi.org/10.14295/jmphc.v16.1395Palavras-chave:
Política de Saúde, Reforma dos Serviços de Saúde, Comunismo, Mercantilização, SangueResumo
A exploração capitalista não é possível sem a coerção corporal. A crítica do trabalho assalariado tampouco pode ser realizada sem examinar os seus efeitos deletérios sobre os corpos. No marxismo e, mais amplamente, no pensamento crítico, a questão é dupla. Por um lado, uma questão política, pois, se a dominação e a opressão passam pelo corpo, a crítica implica uma análise do corpo, necessariamente. Por outro lado, a nossa época é especialmente caracterizada pelo auge da economia do bem-estar e da saúde, pelo desenvolvimento das indústrias farmacêuticas, das biotecnologias e do comércio de órgãos que visam restaurar o corpo. É nesta dialética que a utilização do corpo humano como mercadoria continua sendo centro de uma dinâmica desenfreada na busca do lucro, no qual o sangue humano entra como objeto de mercadorização. Em contrapartida no Brasil, a Lei nº 10.205, de 21 de março de 2001, que regulamenta o inciso 4° do artigo 199 da CF-88, representou um avanço significativo na instituição da política de sangue, seus componentes e hemoderivados. Desde esta lei foi possível regulamentar um sistema que monitora, avalia e melhora as condições de todo o ciclo do sangue, sendo focada na doação altruísta e não remunerada do doador, estimulada, pelo advento da AIDS e por razões econômicas. No entanto, ao avanço neofascista no Estado brasileiro, em 2017 foi realizado um diagnóstico pelo TCU e o MP no qual afirma que foram perdidos 597.975 litros de plasma no país, o que equivale ao material coletado em 2.718.067 doações de sangue. Em 2020, com a pandemia de COVID-19, a coleta de sangue e plasma apresentaram queda em nível mundial. Com base nestes argumentos, foi apresentada a PEC nº 10/22 que altera o art.199 da CF-88 para dispor sobre as condições e os requisitos para a coleta e o processamento de plasma humano. A proposta prevê a autorização da coleta remunerada do plasma humano e a comercialização do plasma sanguíneo e dos hemoderivados, consequentemente, desfazendo a oferta do sangue humano como produto do altruísmo e da não remuneração. A atual política de sangue cristaliza as correlações de forças dos diferentes interesses socioeconômicos sobre a forte tendência para o desmonte das políticas públicas de caráter universal, a favor da hegemonia de um projeto privatizante no qual o sangue assume a forma-mercadoria. Para entendermos a tendência mercantil do sangue, iremos mergulhar na análise política da sociedade, decifrando o lugar simbólico do corpo no capitalismo, o que nos permitirá demonstrar os fatores críticos de associação do sangue à forma-valor. Assim, o objetivo geral deste trabalho é compreender a relação corpo-mercadoria a partir de um referencial marxista como construção de subsídio crítico sobre a tendência da mercantilização do sangue. Os objetivos específicos são: conhecer a categoria “corpo” desenvolvida pelo pensamento de Gerardo Ávalos; descrever a análise marxista dos corpos pelos autores Stephane Haber e Emmanuel Renault e, por fim, relacionar o sangue humano à forma-valor. Usou-se como metodologia de investigação a pesquisa documental, com orientação no método dialético sobre as categorias ‘corpo’ e ‘mercadoria’ a partir do capítulo “Cuerpo y poder: hacia uma filosofia política de las somatizaciones sociales pós-modernas” de Gerardo Ávalos Tenório e do artigo “Analyse marxist du corps” dos autores Stephane Haber e Emmanuel Renault. O corpo é assumido principalmente como referente da vida e da realidade, portanto, da vulnerabilidade e da finitude. Enquanto corpo considerado biologicamente, este é praticamente irrelevante na determinação do seu significado social, uma vez que aí, é abstrato. Ao ser revestido dos hábitos correspondentes, o corpo torna-se socialmente construído pois passa a estar situado num tempo e espaço historicamente determinados. Em Marx, o corpo é abordado através da definição de valor. A função da teoria do valor é determinar a forma como a mais-valia (e, portanto, o produto da exploração capitalista) é compatível com uma troca de equivalentes. Todo trabalho é dispêndio de força de trabalho humana num sentido fisiológico e é nesta condição de trabalho humano igual, ou trabalho abstratamente humano, que se constitui o valor da mercadoria. Mas o capitalismo transforma o corpo ‘força de trabalho’ numa mercadoria dotada de valor e esse valor é definido pela quantidade de trabalho socialmente necessária para a reconstituição da sua capacidade biológica de trabalhar. O sofrimento e a vida insuportável introduzidos pelas condições de trabalho no próprio espaço de produção deram origem a movimentos de resistência e de luta que, acabou por reorientar o capitalismo para o caminho da extração de mais-valia relativa e isso introduziu novas formas de opressão dos corpos (fragmentação e desapropriação do corpo pela maquinaria) assim como novas resistências. Uma destas novas resistências se concentra na mercantilização do corpo humano e suas partes/componentes, tal como é o caso do sangue humano. Seguindo este caminho, como os hemocomponentes atualmente são produzidos a partir de plasma humano em indústrias e sua tendência de liberação mercantil é ser aludida à apropriação capitalista, o sangue, como parte essencial que dá vida ao corpo humano, sofrerá os efeitos deletérios desta tendência. Individualmente a exploração do sangue para o doador acomete sua proteção, já para o receptor, sua saúde, desde o comprometimento da qualidade do sangue doado, porque perderia a confiança neste novo perfil de doador remunerado, até a venda de bolsas de sangue para cirurgias, acidentes etc. Se esta análise se mostra correta, o corpo nunca existe apenas no seu sentido biológico, mas está sempre preso em disposições técnicas, sociais e económicas. Assim sendo, o sangue-mercadoria passa a estar determinado de acordo com as relações de classe, gênero e raça conservando essas regras do jogo social capitalista. A crítica realizada neste estudo é dos efeitos produzidos sobre o sangue, sob à alienação de partes do corpo humano e da exploração do trabalho humano que reduz tudo à forma-mercadoria. O sangue, como parte do processo de valorização, passa a assumir forma mercantil nas relações sociais, tornando o que há de mais essencial na composição biológica dos corpos, algo compatível como os infortúnios e as modificações que estes corpos individuais sofrem como consequência da organização capitalista do trabalho.
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