Implicações do financiamento do tratamento oncológico no SUS e a sua judicialização
uma revisão da literatura
DOI:
https://doi.org/10.14295/jmphc.v14.1220Palavras-chave:
Oncologia, Judicialização da Saúde, Financiamento da Assistência à SaúdeResumo
No contexto recente, o financiamento do Sistema Único de Saúde – SUS tem gerado inúmeros debates acerca de sua tendência de tornar-se cada vez mais insuficiente, sendo considerado por muitos como subfinanciamento ou desfinanciamento, o que poderá acarretar em um aniquilamento da manutenção de um sistema universal de saúde. Esse processo de desfinanciamento tem como principal símbolo a Emenda Constitucional – EC n. 95/2016, que limita a expansão dos gastos públicos pelos próximos 20 anos, baseada no valor das despesas de 2017. Pesquisa publicada em 2016 estimou uma diminuição do recurso em cerca de R$ 318 bilhões entre 2003 e 2015, caso a medida tivesse sido implementada em 2003, o que corresponde a três anos de orçamento, tendo como base o ano de 2015. Em um cenário de escassez de recursos, chama a atenção a evolução de gastos na aquisição de medicamentos no SUS. No Brasil, enquanto os gastos totais com saúde aumentaram em 9,6% entre os anos de 2002 e 2006, os gastos com medicamentos tiveram um incremento de 123,9%, impulsionados principalmente por terapias relacionadas à média e alta complexidade. A evolução dos gastos com medicamentos e sua contribuição para ampliação da cobertura e melhoria do acesso a medicamentos pela população deve ser observada de maneira criteriosa, porque parte dessa demanda inclui as despesas com medicamentos adquiridos em razão de decisões judiciais. Com relação aos gastos com ações judiciais do governo federal entre os anos de 2010 e 2016, houve um crescimento do gasto de 547% e tem preocupado gestores públicos pelo potencial de produzir iniquidades no SUS. Ao se explorar os dados de publicações referentes às ações judiciais, observa-se que a oncologia é responsável por parte significativa do número de ações judiciais, assim como das despesas relacionadas ao atendimento dessa demanda. Considerando o atual modelo de financiamento do atendimento oncológico, no qual os serviços especializados são ressarcidos por Autorização de Procedimentos Ambulatoriais – APAC, com o valor global de atendimento, sem o estabelecimento de uma relação de medicamentos e desvinculada da Assistência Farmacêutica, este trabalho tem como objetivo identificar a relação entre a judicialização e o financiamento do tratamento oncológico no SUS. Trata-se de revisão integrativa da literatura utilizando-se as bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde – BVS e SciELO. Os descritores foram definidos através da pergunta da pesquisa, o que possibilitou a formulação da sintaxe alinhada aos objetivos propostos nesta revisão. A pergunta da pesquisa norteadora desta revisão é: O que a literatura científica relata sobre a relação entre o financiamento no tratamento oncológico no SUS e sua judicialização? Utilizou-se a técnica de funil, combinando-se diversos descritores relacionados ao tema. Buscou-se descritores representantes das áreas temáticas, oncologia representando a população, judicialização representando o fenômeno e financiamento representando o contexto. Os descritores foram identificados através da plataforma Descritores em Ciências da Saúde – DeCS, e selecionados de acordo com o escopo de definição dos mesmos. Foram efetuadas buscas individuais para cada descritor identificado e desenvolvidas sintaxes com o operador boleano “OR” para cada grupo temático. As pesquisas foram realizadas no dia 01 de fevereiro de 2022 na base de dados BVS e após definição da sintaxe final, foi aplicada na base de dados SciELO em 05 de fevereiro de 2022. Ao agrupar-se as sintaxes dos três eixos temáticos, utilizando-se o operador booleano “AND” foram identificadas apenas quatro publicações. Prosseguiu-se, portanto, a novas testagens visando que a sintaxe obtivesse um maior número de publicações, resultando na seguinte sintaxe: ("judicialização") OR ("Decisões Judiciais") AND ("oncologia") OR ("Antineoplásicos") OR ("neoplasia"). Após a definição da sintaxe final, efetuou-se a busca nas bases de dados BVS, a qual resultou em 328 publicações e na base de dados SciELO resultando em 172 publicações até a data de 05 de fevereiro de 2022, utilizando-se o critério de “Título, Resumo e Assunto” na base de dados BVS e “todos os índices" na base de dados SciELO. As publicações foram extraídas utilizando-se os filtros presentes na BVS e SciELO para seleção do tipo de publicação ao optar-se somente pelos artigos, do total de 500 publicações identificadas, 77 foram excluídas por tipo. A análise dos artigos duplicados foi realizada utilizando-se a ferramenta Zotero e 107 excluídas por repetição. Procedeu-se a avaliação dos títulos dos 316 artigos aplicando-se critérios de inclusão e exclusão, nesta etapa 257 artigos foram excluídos, resultando em 59 artigos para apreciação dos resumos. Após leitura dos resumos, 51 foram excluídos por divergirem do escopo proposto nesta revisão integrativa. Ao final, oito artigos foram selecionados para composição deste estudo e todos encontram-se integralmente disponíveis. Os artigos selecionados foram publicados entre os anos de 2007 e 2017. Os principais editoriais de publicação dos artigos selecionados são a “Revista de Saúde Pública” e o “Caderno Ibero Americano de Direito Sanitário”. Cinco artigos debatem a judicialização de medicamentos, em especial os antineoplásicos, em relação a estruturação da Assistência Farmacêutica e como a lógica de fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS pode comprometer a gestão orçamentária e gerar iniquidades. Um artigo discute especificamente o uso de medicamentos antineoplásicos off-label em ações judiciais. Dois artigos discutem a relação entre a judicialização e a incorporação de novas tecnologias, principalmente sobre o tempo oneroso na incorporação, o que limita o atendimento aos pacientes oncológicos. Outros ainda sobre como a judicialização pode forçar a incorporação de tecnologias. Como considerações preliminares, observa-se que embora a judicialização traga inúmeros debates e dificuldades na gestão do SUS, poucos estudos buscam compreender suas possíveis causas e pontos focais estratégicos para uma possível solução.
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